Uma enxurrada de anúncios faz companhia às notícias sobre a crise hídrica. O final do ano se aproxima e com ele a massiva perpetuação da mensagem do consumo pelo consumo como forma de demonstrar afeto. As crianças não estão imunes às investidas constantes das agências de marketing e dos estímulos propositalmente direcionados a elas, especialmente neste período.
No entanto, é possível, ainda que imersos nessa névoa do consumo, repensar e recriar a forma de relação entre as crianças – e também os adultos – e os objetos de desejo, como brinquedos, roupas, sapatos, jogos, etc. Os pequenos – como seres atuantes no mundo – são protagonistas desse processo de mudança que se desenrola e mira em um consumo mais consciente e sustentável.
É possível perceber, mesmo que de maneira lenta e gradual, que novos modelos de consumo estão sendo tecidos e, não à toa, as mesmas emergências climáticas que disputam com os anúncios os espaços nos jornais, tem sido os vendavais que nos sacodem e nos movimentam para uma importante – e urgente – ressignificação no consumir.
Então, colocando as crianças no centro dessa transformação, compartilho com vocês, neste artigo, algumas informações importantes sobre consumo consciente e dicas de iniciativas que caminham para esse propósito. Vamos lá?
Para além da data comercial, uma nova de estar no mundo
“Entendo bem o sotaque das águas
Dou respeito às coisas desimportantes
e aos seres desimportantes.
Prezo insetos mais que aviões.
Prezo a velocidade
das tartarugas mais que a dos mísseis.
Tenho em mim um atraso de nascença.
Eu fui aparelhado
para gostar de passarinhos”.
Manoel de Barros
Antes de apresentar as dicas que podem auxiliar as famílias e os educadores, gostaria de destacar que as datas comemorativas, como o Natal, podem ser vistas como portais que se abrem e permitem o acesso a outras camadas e possibilidades de estar e atuar no mundo.
Em casa, mães, pais, filhas e filhos podem ter um espaço acolhedor para uma conversa, uma troca, acerca de temas que abarcam a nossa existência, como as questões ecológicas e políticas, e que estão relacionados diretamente ao consumo excessivo.
Da mesma maneira que as crianças são, constantemente, afetadas por propagandas e estímulos de compra – em 2008 os investimentos publicitários destinados à categoria de produtos infantis no Brasil foram de 209, 7 milhões de reais – elas também podem ser atravessadas por experiências e reflexões capazes de despertá-las para novos significados, sentidos e sentires na maneira de consumir.
Por isso, a ideia deste texto. Para falar sobre vivências nas quais o agir infantil seja transformador de realidades, no plural, com vista para o bem-estar coletivo.
Uso da água e os impactos ambientais nas crianças
Um dos entraves ambientais de maior impacto é a questão da água – ou da falta d’água. Então, uma dica é visitar sites de instituições que cuidam do meio ambiente ou de organizações nacionais que abordam o assunto, com responsabilidade, para ter acesso à informação de qualidade.
Para os pais, o site Lunetas traz reportagens e elementos que auxiliam no entendimento de como as emergências climáticas afetam as crianças e de como elas, enquanto cidadãs, podem atuar como um futuro conjugado no presente. Um exemplo são as ilustrações e gifs animados que trazem, de forma simples e sutil, a relação fundamental e vital entre natureza e ser humano.
Outra dica é utilizar as próprias experiências do cotidiano para tratar do assunto. Em uma caminhada pelo parque, por exemplo, a criança pode sentir a mudança de temperatura que acontece ao estar entre as árvores. Na hora do banho, de escovar os dentes, de lavar a louça, sempre que houver consumo de água, trazer para o lúdico a experiência de fechar a torneira e não deixar toda água do rio ir embora pelo ralo.
Consumo consciente de alimentos
No momento das refeições, na ida ao supermercado, no pedido de delivery. É também a partir da experiência e da observação do adulto que a criança vai formando sua própria atuação no mundo.
Por isso, nessas situações, é importante que os pais, as mães, as pessoas responsáveis pelo cuidado estejam conscientes de suas ações e prezem por um consumo sustentável, que evite o desperdício de alimentos no prato e na geladeira.
Outra forma de consumir de forma consciente os alimentos e ter a experiência junto das crianças é optar por realizar a compra de pequenos produtores e de estabelecimentos que estejam preocupados com o bem-estar do planeta.
Ao ir à feira, ao mercadinho, ao falar com as pessoas que produzem, ao escolher o que colocar na sacola, ao saber qual a fruta da época. Diante dessas vivências, a criança poderá ter contato com uma outra perspectiva do consumo e do próprio alimento.
Reciclagem para menos lixo
Caixas de ovo, isopor, prendedores de roupa. O que era lixo vira dedoches, personagens de histórias, carimbos e um momento para ser compartilhado. Uma pausa no relógio das tarefas a cumprir para tirar do lixo e da natureza o que pode virar brinquedo.
A ideia de reunir as crianças para que elas possam, pelas próprias mãos, criar objetos novos e divertidos estimula a criatividade, a autonomia e coloca os pequenos como protagonistas de transformações.
Além disso, trata-se de uma atividade que convida para o coletivo, para o fazer junto, com a união de forças e mãos.
Doação de roupas e brinquedos e compras de final de ano
Um movimento importante neste período é realizar, junto das crianças, a separação de roupas e brinquedos para doar. A iniciativa desestimula o apego exagerado aos bens materiais e desperta para a rede colaborativa, para a partilha.
Economia circular no Natal
Ainda neste sentido de final de ano ressignificado, o Movimento Circular é uma iniciativa que traz, justamente, a proposta de repensar a maneira de presentear amigos e familiares no Natal, além de nos fazer pensar sobre o uso das embalagens de presente e sobre a quantidade de comida para a ceia. As provocações são para evitar o desperdício, o exagero e o descarte de lixo no meio ambiente.
Outra maneira de fazer a economia circular acontecer é identificar, dentro dos grupos próximos, como de pais e mães da escola, quais têm serviços ou produtos próprios que possam servir de uma lembrança de Natal. Uma maneira mais consciente de consumir do que ir ao shopping center, por exemplo.
As crianças podem – e devem – fazer parte desses momentos de planejamento, preparação e organização para que também possam contribuir com ideias e alternativas mais criativas e sustentáveis.
Teste de consumo consciente
Aqui, uma dica para fazer de aliada a tecnologia no consumo consciente das crianças e dos adultos. O Instituto Akatu tem o Teste do Consumo Consciente, que analisa comportamentos e valores para avaliar o grau de consciência ao consumir algo.
O teste traça os perfis de consumidor de acordo com a escala de consciência do Akatu e engloba desde o consumo de água e energia elétrica, em casa, até a maneira como você planeja as compras.
Projetos para educadores
Por fim, para que haja o protagonismo das crianças no consumo consciente, os educadores e as educadoras também têm papel fundamental. Por isso, coloco aqui a dica do Edukatu, um programa que visa incentivar a troca de conhecimentos e práticas sobre consumo consciente e sustentabilidade entre professores e alunos do Ensino Fundamental de escolas em todo o Brasil.
Com material e projetos de referência, o espaço guarda um verdadeiro tesouro pronto para ser aliado na prática de uma atitude mais responsável perante o mundo, o meio ambiente e as pessoas. As informações disponíveis na plataforma do Edukatu convidam os participantes a realizar atividades por meio de circuitos de aprendizagem e, assim, ter contato com experiências inovadoras.