Crianças e internet: como os pais podem mediar melhor essa relação?

 

Nosso encontro por aqui, neste artigo, foi possível por uma conexão. A internet não é, exatamente, uma novidade na vida da maioria das pessoas – mas as formas de aplicá-la no dia a dia, talvez, sim. Apesar da evidente desigualdade no acesso, estamos cada vez mais encarando as telas para realizar diversas atividades. Das reuniões aos pedidos por delivery, tele consultas e compras online, além das espiadas nas redes sociais: você, provavelmente, se vê em alguma dessas situações.

 

O mundo contemporâneo está todo conectado e, principalmente pela pandemia da COVID-19 e pela invasão da escola e do trabalho nas casas, a nossa relação com os eletrônicos ficou mais intensa e mais íntima, afetando diretamente as dinâmicas familiares. E não somos somente nós, adultos, que estamos mais imersos no mundo virtual. As crianças e adolescentes também estão bem próximos e conectados: no Brasil, 89% deles, entre 9 e 17 anos, acessam à internet, de acordo com a pesquisa TIC Kids Online Brasil 2019.

 

Nesse contexto, muitos pais têm me procurado para buscar orientação quanto ao uso da internet e dos eletrônicos pelos seus filhos. Você também tem dúvidas sobre o tempo adequado de uso, sobre qual a melhor forma de monitorar o comportamento online e os conteúdos consumidos ou ainda qual abordagem mais efetiva? Hoje, nossa conversa será para te ajudar em relação a essa mediação que, de forma ativa, proporciona mais segurança e também contribui no desenvolvimento de habilidades para crianças e adolescentes navegarem pelas redes de um mundo digital.

 

Lugar de experiências, mas que demanda acompanhamento parental

 

O acesso à internet traz consigo uma série de possibilidades positivas e importantes para crianças e adolescentes, como espaços educativos, de lazer, de informação e de interação social. Embora o uso desses equipamentos tecnológicos seja bastante natural para muitos, eles podem não saber dos diversos potenciais perigos por trás de seus cliques.

 

Isso porque a internet nos traz uma certa familiaridade e uma falsa sensação de segurança: nos sentimos protegidos por trás das telas e dos teclados. Mas, entre uma visita de um site e outro, nossas informações circulam em grande quantidade e qualidade. 

 

Carissa Véliz, professora da universidade de Oxford, e outros cientistas de proteção de dados têm constantemente apresentado que não há privacidade no campo das redes sociais. Cada clique, cada postagem ou pesquisa são monitorados e vendidos como informações valiosas para o mercado, seja para incitar o consumo de um item da moda, seja para formar uma opinião sobre o assunto ou até para incentivar determinado comportamento.

 

Neste sentido, o Instituto Alana, ONG que tem por valor a defesa dos direitos de criança e do adolescente, a partir de estudos e falas de especialistas, aponta para os perigos envolvidos no uso das tecnologia digitais, como a coleta massiva e o tratamento de dados dos usuários, que expõem a população infantojuvenil às mais diversas formas de vulnerabilidades e violação de privacidade, desde coleta de dados de idade, sexo, como preferências de lazer, de consumo, de modos de vida e, por vezes, os evidenciam à violência, à publicidade infantil e ao sexo. 

 

Medidas de proteção ainda são incipientes 

 

No Brasil, a Lei Geral de Proteção de Dados foi aprovada, mas ainda está em fase de implementação nas empresas. Além disso, desde 2020, tramita o Projeto de Lei 2630/2020 que, mesmo sendo originalmente criado para combater a disseminação de notícias falsas na internet, recebeu críticas por viabilizar a coleta massiva de dados e por propor que as plataformas não retirem imediatamente conteúdos ilícitos – por exemplo aqueles que exibem exploração sexual infantil ou fazem incitação ao comportamento de suicídio e de automutilação. Tal ação, portanto, acaba por trazer mais riscos à segurança e à privacidade, especialmente a de crianças e de adolescentes. 

 

Como, então, ajudar os seus filhos a lidar com este ambiente virtual?

 

De acordo com a Convenção dos Direitos da Criança (ONU/UNICEF, 1990), é “responsabilidade parental, instruir, assistir, orientar e monitorar crianças e adolescentes com relação ao uso da internet em casa, na escola, na casa de amigos, em lan houses ou em outros lugares, para qualquer finalidade, até que atinjam minimamente a maioridade civil aos 18 anos de vida.”  

 

O TIC Kids Online Brasil 2019 mostra que 78% da população de 15 a 17 anos realiza pesquisas na Internet por curiosidade ou vontade própria e que 40% dessa faixa etária conversou por chamada de vídeo. Além disso, 82% das crianças e adolescentes usuárias de internet relatam usar e ter perfil nas redes sociais; e para 83%, entre 09 e 17 anos, assistir a vídeos, filmes e séries é a atividade mais frequente na Internet. Não à toa, plataformas como Facebook e YouTube devem ter novas normas para aumentar a responsabilização em relação ao conteúdo e à publicidade infantil.

 

Esses comportamentos apresentam potenciais riscos, seja por conteúdos sensíveis, de cunho sexual, seja por tratamento ofensivo e discriminatório, cyberbullying ou ainda por apelos de marketing e de estímulo ao consumo. O fato é que não estamos protegidos para os mais diversos usos das nossas informações no mundo e submundo cibernético, e essa situação nos convida a termos um olhar mais atento e presente quanto ao uso dos dispositivos eletrônicos pelas nossas crianças e adolescentes. A partir desse cenário, oriento aos pais que estejam sempre atentos ao conteúdo que é visto, buscado e postado por seus filhos nas redes sociais, pois o que eles acham que “é só para meus amigos” pode ser na verdade, para o mundo todo. 

 

Sem querer exorcizar a internet como a grande vilã, já que ela também pode ser um espaço de aprendizado e uma janela para o mundo, eis algumas das minhas orientações aos pais atentos:

 

  • Comunicação é a chave: dialogue abertamente com seu filho, sem terrorismo, sobre os cuidados durante o uso da internet, os riscos, os cuidados e o que significa segurança nesse ambiente. Oriente-o para procurar os adultos diante de situações de dúvida, de constrangimento e de embaraço. Isso é  fundamental para uma experiência segura. 
  • Segurança é coisa séria: aborde a questão da sensação de segurança e familiaridade que a internet nos dá, orientando a não aceitar nas redes sociais as pessoas que não conhece na vida real, bem como não compartilhar informações particulares nos jogos virtuais e redes sociais.
  • Conteúdo compartilhado: hoje um dos aplicativos mais usados pelos adolescentes é o TikTok, mas já temos diversas informações sobre a não segurança dos dados nessa plataforma – embora isso também seja uma questão de muitos outros apps. Converse de forma clara sobre o que publicar. Explique que aquela foto ou vídeo entre amigos ou aquele conteúdo que expõe demais o corpo poderá ser interpretado de uma forma distorcida por terceiros,  já que, como falamos, não temos total controle de quem poderá acessar os conteúdos que compartilhamos. Esse é outro importante passo para tornar a presença dos seus filhos nas redes sociais e aplicativos de mensagem mais saudável e positiva.
  • Controle dos pais: fazer uso da internet e das tecnologias digitais é um fato desta geração, não há como negar, nem fugir. Neste sentido, oriento ter controle das redes sociais de seus filhos como forma de monitoramento e de cuidado com os conteúdos publicados e em relação às pessoas com quem eles têm contato.
  • Tempo de tela: apesar de a segurança ser uma preocupação central, o tempo em frente à tela também é fator que exige cuidado, já que, em demasiado, pode afetar o desenvolvimento das crianças em termos de comunicação, de sociabilidade, de habilidades motoras e de resolução de problemas. Segundo a OMS (Organização Mundial da Saúde), as recomendações são:

 

  • Menores de 2 anos:  não devem usar eletrônicos;
  • Dos 2 aos 5 anos: uso de, no máximo, 1 hora por dia (com supervisão de adultos);
  • Dos 6 aos 10 anos: uso de, no máximo, 2 horas por dia (com supervisão de adultos);
  • Dos 12 anos em diante: uso de, no máximo, 3 horas por dia.

 

A mediação ativa e positiva, em que não é imposta uma restrição, mas, sim, em que há uma postura capaz de abrir campo para o diálogo e para a explicação clara dos riscos e das oportunidades, contribui para o desenvolvimento de habilidades que farão seus filhos explorarem a Internet de forma mais segura, proveitosa e benéfica.

 

Como é para você trabalhar esses pontos na hora de mediar a relação deles com a Internet? Existem outras dificuldades? Podemos trocar mais sobre este assunto. Deixe um comentário ou entre em contato para agendar uma conversa.

 

Até a próxima!

Abraços, 

Carol Freire.