Perguntas e respostas sobre Psicoterapia

“Pequeno Esclarecimento
Os poetas não são azuis nem nada, como pensam alguns supersticiosos, nem sujeitos a ataques súbitos de levitação. O de que eles mais gostam é estar em silêncio – um silêncio que subjaz a quaisquer escapes motorísticos e declamatórios. Um silêncio… Este impoluível silêncio em que escrevo e em que tu me lês.”

Mario Quintana

A palavra Psicoterapia poderia ser substituída por trilha. Ou caminho, ou trilhas, caminhos, tudo no plural. Isso porque a Psicoterapia, para além de uma prática da área da saúde, é um movimento que se faz em busca de algo. E, neste sentido, o movimento de procura é muito particular e que não se encerra em uma determinada e única estrada ou jornada. Por isso, o plural dentro da subjetividade de cada pessoa que busca dentro da Psicoterapia. Falar sobre o que é a Psicoterapia poderia, sem dúvidas, render páginas e páginas de escritas. Mas, o que pretendo aqui é falar sobre como a Psicoterapia pode ser aplicada na prática, sobre como a Psicoterapia, que acredito, considera as questões sociais e culturais dos sofrimentos individuais e de como ela pode ser um suporte para se descobrir ser quem se é. Para isso, compartilho aqui um perguntas e respostas. Vamos lá?

O que não é a Psicoterapia?

Vamos começar invertendo a lógica e dizendo o que não é Psicoterapia, pois há muito mal entendido – ou mal explicado – por aí. Bem, a Psicoterapia não é um tratamento indicado para pessoas que, por algum motivo, se sentem culpadas ou erradas de alguma forma. Na verdade, as pessoas que se sentem culpadas ou erradas podem buscar a terapia, mas o que ela não deve ser é um espaço para “correção” ou “adequação”. A Psicoterapia não é um lugar no qual as pessoas são corrigidas, muito menos um lugar no qual são ensinados valores, normas e dicas de como se viver ou fazer. Não se trata de uma lista, de “TO DO´s”.

Outra questão que entendo fundamental de ser esclarecida é que, do mesmo modo em que a Psicoterapia não é um lugar no qual são ensinados modos corretos de agir, a terapeuta não é aquela que sabe. O profissional não tem fórmulas prontas para resolução dos problemas. O terapeuta, assim como disse Quintana sobre os poetas no poema que escolhi para abrir este texto, “não são azuis nem nada”. Não há nada de supersticioso. Há escuta e silêncio, de quem não sabe, mas que permite e abre espaços para a compreensão do outro. 

Importante destacar que não entendo o espaço da terapia como um espaço de fórmulas. Aquelas fórmulas de sucesso, pré-estabelecidas, que são passadas pela terapeuta e que devem ser seguidas pelos pacientes. 

O que é a Psicoterapia?

Bem, passemos agora para a compreensão do que é a Psicoterapia. A Psicoterapia é um processo de escuta profissional, atenta e acolhedora, que não julga, e que permite ao indivíduo encontrar-se e assumir-se enquanto pessoa em desenvolvimento, é um processo intensivo de encontro consigo mesmo, potencializado no contexto de uma relação pessoal. Ela propicia compreensões e descobertas em um espaço protegido, com suporte profissional, no qual se pode estabelecer vínculo e confiança.

É um processo que envolve, pelo menos, duas grandes posturas: acolher com simpatia (acolhimento é o solo sobre o qual poderá se desenvolver o processo da pessoa), compreender com empatia (compreender vai além de apropriar-se dos significados literais daquilo que a pessoa diz; transporta-nos para o sentido novo apontado por esses significados no contexto daquela fala).

Mas, como falei acima, podemos entender a Psicoterapia também como um movimento de procura, que se estabelece durante todo o processo, a cada passo, a cada encontro, e não no final. A Psicoterapia acontece por meio da linguagem, da escuta, da fala, da elaboração dos afetos, emoções, nós e traumas. 

No entanto, é preciso dizer que, como falam Pompéia e Sapienza, no livro “Na Presença do Sentido”,

‘não é pela via da razão que caminha a linguagem da terapia. A linguagem própria do diálogo entre terapeuta e paciente tem uma outra via, para cuja compreensão é importante introduzirmos aqui uma palavra grega, poiesis. Esta significa não só poesia no sentido específico, como também criação ou produção em sentido mais amplo’.

Ou seja, por meio da linguagem que é capaz de dar vida àquilo que não existe, a colocar luz sobre determinados aspectos até então desconhecidos, a desocultar as coisas. E a compreendê-las.  Aqui, vale destacar uma diferença importante entre os termos explicação e compreensão, pois a primeira está em uma perspectiva da linguagem do conhecimento, enquanto que a compreensão acontece sob uma troca, um diálogo voltado à linguagem da poiesis (aquela que cria). A compreensão aproxima as pessoas e as suas experiências, as valida e não as afasta, reprime ou julga.

“Ao se abrir pessoalmente para a pessoa, o terapeuta potencializa  ao máximo a relação que ali acontece no que se refere ao  processo dela se conhecer melhor e desencadear seus recursos internos de desenvolvimento”.

Carl Rogers

O que a Psicoterapia busca?

Continuando o caminho – ou os caminhos da Psicoterapia -, vamos ao sentido do que ela busca. A Psicoterapia busca a verdade. Mas, vejam bem, falo aqui de uma verdade que não se limita ao significado de verificável, daquilo que pode ser comprovado. O que se procura na Psicoterapia é uma verdade pela via poiesis, uma verdade da linguagem poética, que se refere ao que deve ser recordado, resgatado.  

‘Viver, é afinar, o instrumento, de dentro prá fora, de fora pra dentro”

Leila Pinheiro

Desse modo, para mim, nos processos de terapia, o movimento que se faz é o de reencontrar a expressão do nosso modo de sentir, principalmente, o do sentir relacionado às coisas que já nos afetaram de modo significativo e profundo, em algum momento da vida, mas que ficaram perdidas, desbotadas e sem sentido dentro de nós. 

A dificuldade de comunicar esses atravessamentos da vida pode ser um dos motivos do desgaste, do sofrimento, e a terapia, como espaço-tempo seguro, possibilita, pela linguagem poética, o reencontro, a retomada, a lucidez do sentir. Possibilita o acesso a uma verdade genuína, que liberta. 

Quem deve procurar pela Psicoterapia?

Gostaria de responder essa pergunta dizendo que não há uma resposta certa ou errada. As pessoas procuram pela Psicoterapia pelos mais diversos motivos. O que, ao meu ver, pode conectá-las, é o estado de sofrimento pelo qual possam estar passando. No entanto, esse sofrimento, muitas vezes, ainda não é nomeado – ou ainda não existe – como dissemos acima sobre a criação por meio da linguagem, que coloca luz, traz para o alcance das mãos, do tato, da voz. Neste processo de busca, podemos ver surgir a consciência. 

A consciência das dores, das amarras, nas circunstâncias também externas – do contexto social e político, por exemplo – que nos afetam e nos causam incômodo, desconforto, ausência de nós mesmos, da nossa verdade. 

Então, como bem citado no artigo, “Desamparo e sociedade capitalista: o que a psicologia tem a dizer?”, talvez ‘o maior contributo da psicologia resida em seu potencial educativo, pelo qual possa operar a serviço da formação e ampliação da consciência humana’. 

Mas, uma ressalva importante aqui. Não falo da psicologia que se identifica ou reproduz o “ideal de conscientização” tal como presente na psicologia burguesa desde as suas origens. Mas sim de uma prática voltada ao que Leontiev denominou como “consciência sobre si” e “autoconsciência”, pois abarca e considera as características externas e internas e as relações sociais nas quais estamos inseridos. 

Assim, defendo uma Psicoterapia que não se fecha em algo exclusivamente individual, pessoal, mas sim uma Psicoterapia que integra as pessoas às condições do mundo que as rodeiam. No nosso caso, do mundo contemporâneo, dos excessos, do imediatismo e da alienação.

Ao ter esse contato consciente e que se expande para além de si mesmo, as pessoas têm a possibilidade de reconhecerem a realidade presente e mais ampla ao passo em que a reconhecem a si mesmas. A partir disso, é possível fazer escolhas, percorrer caminhos e trilhas com mais consciência e autonomia. 

Quais convites a Psicoterapia nos faz?

A Psicoterapia, como disse anteriormente, é um processo de escuta, atenta e acolhedora, que não julga, e que permite que as pessoas se encontrem e se compreendam como seres em desenvolvimento e em movimento.

Assim, diante da compreensão de si e do acesso à expansão de consciência, o processo da terapia nos convida e proporciona escolhas. E, para falar sobre isso, gosto muito de citar o poema da Cecília Meireles “Ou isto, ou aquilo”:

Ou se tem chuva e não se tem sol,
ou se tem sol e não se tem chuva!

Ou se calça a luva e não se põe o anel,
ou se põe o anel e não se calça a luva!

Quem sobe nos ares não fica no chão,
quem fica no chão não sobe nos ares.

É uma grande pena que não se possa
estar ao mesmo tempo nos dois lugares!

Ou guardo o dinheiro e não compro o doce,
ou compro o doce e gasto o dinheiro.

Ou isto ou aquilo: ou isto ou aquilo…
e vivo escolhendo o dia inteiro!

Não sei se brinco, não sei se estudo,
se saio correndo ou fico tranquilo.

Mas não consegui entender ainda
qual é melhor: se é isto ou aquilo.

Cecília Meireles

As dúvidas são inerentes aos seres humanos, assim como as ausências. Somos dúvidas e, em geral, não há resposta certa. Há escolhas que podemos fazer de forma consciente ou não. A partir delas, teremos de lidar com seus desdobramentos – consequências me soam como punição – e com as ausências provocadas por não termos feito a outra escolha. 

Durante o processo de Psicoterapia, surgem convites para o recordar, para o rever, para o reviver, para o trazer para o coração o que ficou sem vínculo. Surge o convite para ressignificar as emoções ao elaborá-las de um novo lugar, o da consciência. 

Quanto tempo dura a Psicoterapia?

Como se trata de um processo pessoal, subjetivo, o tempo de duração da terapia vai variar de pessoa para pessoa, do seu processo interno de acesso às questões e do tipo de queixa. A Psicoterapia pode ser aplicada de forma focal – quando se trabalha um tema/foco específico, com a duração de poucos encontros – ou pode ser um processo mais longo de autoconhecimento e durar meses ou até anos.

Quanto tempo dura a sessão de Psicoterapia?

Em média, as sessões individuais duram cerca de 50 minutos. Já as sessões de casal e família duram cerca de uma hora e meia a duas horas.

Por que fazer Psicoterapia?

Para encerrar esse bate-papo sobre Psicoterapia, gostaria de falar um pouquinho sobre por que se faz terapia. Ao longo de nossa existência, podemos nos perder, podemos sentir dificuldade para seguir nosso rumo. E, quando nos vemos nessa situação, é quando precisamos ir em busca. Como falei no início, Psicoterapia é procura, é a procura por compreensão, por cuidado. Então, a razão pela qual se passa pelo processo de Psicoterapia está no desejo dessa procura que é capaz de libertar. 

Eu, enquanto terapeuta, devo também buscar aprender e inventar uma nova maneira de estar na clínica em um cenário que, infelizmente, é sufocador e ameaçador, sublinhando as angústias e as dores humanas. Busco, por meio da minha prática, possibilitar caminhos e cores para que cada pessoa escolha e pinte seus passos e trace sua jornada. 

Mesmo diante do que parece ser impossível, abrir um tempo-espaço de silêncio, de escuta, de acolhimento e de colorido. De minha parte, não há promessas de solução e eficácia em menos tempo, há o tempo de cada existência florir com consciência e resistência. 

Espero que as perguntas e respostas aqui tenham colaborado para uma compreensão maior do que a Psicoterapia e o modo como eu, enquanto profissional da área, a coloco no mundo. Para saber mais sobre o processo de Psicoterapia comigo, te convido para acessar meu site.
Até mais! 

 

Referências:

Artigo: Desamparo e sociedade capitalista: o que a psicologia tem a dizer?
Livro: Na Presença do Sentido: Uma aproximação fenomenológica a questões existenciais básicas
Livro: AMATUZZI, M. Rogers: Ética Humanista e Psicoterapia. Campinas/SP: Editora Alínea, 2010
Artigo: Por uma clínica que venha nos trazer sol de primavera